Poesia é coisa séria no Irã. Quase todo mundo sabe de cor um monte de versos, rodas de amigos adoram debater autores e um dos principais ícones nacionais é o poeta Hafez (1310-1390), cujo túmulo em Shiraz atrai romaria do país inteiro. Hafez, aliás, era crente e capaz de recitar o Corão inteiro, mas celebrou em sua obra a embriaguez e o amor.
O gosto pela poesia parece ser um traço milenar da cultura persa, e até hoje pais dão aos filhos nomes, ou prenomes para ser mais exato, que são pura metáfora. Uns são bucólicos, outros românticos. Há também os metafísicos. É exemplo pra todo lado.
Tenho uma amiga que se chama Yeganeh (única no mundo). A irmã dela é Taraneh (canção). A chefe da agência Reuters no Irã leva o prenome de Parisa (aquela que é como uma fada). O da iraniana mais famosa do planeta, a ativista de direitos humanos e Nobel da Paz Shirin Ebadi, significa “doce”. Não confundir com “açúcar”, ou Paníz, em farsi, como é chamada minha assistente. Simin, personagem principal do badalado e premiado filme “A Separação”, quer dizer “aquela que brilha como prata”.
Homens também levam prenomes na mesma linha. Meu cabeleireiro é Behrooz (dia feliz), e o recepcionista do hotel onde fiquei ao chegar, Navid (boa notícia). Um tempo atrás entrevistei um cantor que se chama Omid (esperança). Conheço um sujeito que é Payam (mensageiro).
Ouvi vários outros nomes poéticos. Meus preferidos são Kohinoor (montanha de luz), Shahin (falcão peregrino) e Parastoo (andorinha).
Mas já repararam que os nomes dos governantes iranianos geralmente não seguem esse padrão? O presidente é Mahmoud [Ahmadinejad]. O líder supremo chama-se Ali [Khamenei], assim como o chanceler [Akbar Salehi] e o poderoso chefe do Parlamento [Larijani]. O Ministro da Defesa chama-se Ahmad [Vahidi] e o primeiro vice-presidente, Mohammad [Reza Rahimi].
Esses são nomes muçulmanos de origem árabe, comuns em famílias mais religiosas e, portanto, mais propensas a endossar o regime teocrático. Afinal, a influência árabe na Pérsia veio com a disseminação do islã, surgido onde é hoje a Arábia Saudita, lá pelos séculos 7, 8 e 9. Antes disso os persas eram essencialmente zoroastras, judeus e cristãos _hoje minorias.
[Folha SP, 1 mar 12]
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