« A Bíblia transcrita em paráfrases poéticas é, de per se,
uma tarefa que além da inspiração para o trabalho poético, requer uma leitura
sistemática, prolongada e atenta das Sagradas Escrituras. Em sonetos, então
ainda mais se acentua o grau de dificuldade da empresa.
O que a poeta Aurora Tondela levou a cabo é um paradigma
único de como a linguagem bíblica, na sua grande intensidade, é poética. Podemos
dispensar, embora seja sempre bom em termos de crítica literária ter presente,
os Harold Bloom e George Steiner, que se
debruçaram sobre os autores fundacionais de alguns livros da Bíblia Sagrada e
da sua linguagem comunicacional divinamente inspirada, isto é, os autores e o
seu texto bíblicos.
Trabalhos literários soberanamente criativos, porque
inspirados nas Sagradas Escrituras, designadamente nos livros poéticos, tem
apelado e sido um doce apetite para poetas de todas as linguagens.
Por exemplo, no início da década de 70, lá longe no tempo
e no espaço, o poeta evangélico brasileiro, o clássico Jonathas Braga, escreveu
todo um “Milagre do Amor” em verso, baseado no livro bíblico de Rute.
Hoje, já em meados da segunda década do século XXI, a
poeta cristã Aurora Tondela empreendeu e continua o seu labor quase de Hércules
com estes sonetos, belíssimos, clássicos, de belo recorte petrarquiano, sáfico,
camoniano, o que quisermos. A Bíblia em Sonetos é, antes de mais e em duas
palavras, um Itinerário Espiritual de longo alcance.
© João Tomaz Parreira
Poeta Cristão Evangélico »
A criação do Céu e da Terra
No princípio era o caos, profundo abismo,
trevas e solidão que se diria
buraco negro de um medonho sismo
de uma terra desértica e vazia.
Sobre esse inexpressivo irrealismo,
sobre essa imensidão de letargia,
as águas sem marés e sem lirismo
não tinham mais que sombras de agonia.
E Deus criou assim a terra e os céus;
sobre eles em surdina se movia
como vento envolvido em estranhos véus.
Em paleta de cor e de harmonia,
com doce voz solene disse Deus:
Faça-se luz! E foi primeiro dia.
Aurora Tondela