sábado, 24 de março de 2012

"Dirty Realism" - Um Paradigma











In English dictionary: “a style of writing, originating in the US in the 1980s, which depicts in great detail the seamier or more mundane aspects of ordinary life”


Um movimento literário, como tantos outros que enriqueceram esteticamente a Europa. Todavia, este é originário dos Estados Unidos, da década de 80, e também poderia ser da de 40, no Brasil, com o poema-chave da nova poética de Manuel Bandeira: “Vou lançar a teoria do poeta sórdido”.

E ultrapassa os objectivos da Beat-Generation, que face ao “Dirty Realism” era um movimento de anjos pela estrada fora, embora os anjos não façam literatura, remetem-se apenas, celestialmente, a cantar o milagre celeste dos Salmos.

O Realismo Sujo capta inocentes e culpados. Nesta escrita, poética ou em prosa, a narrativa é despida até ao osso. Bandeira antecipou e definiu bem, escrevendo que o poeta sórdido é “aquele em cuja poesia há a marca suja da vida”.

Às vezes, quase sempre, não são os autores que nomeiam o seu movimento, em regra têm sido os jornalistas ( como o Impressionismo assim foi, em 1870). O editor da revista sobre a escrita nova, Granta, Bill Buford baptizou o movimento, como literatura em que a narrativa é despojada de suas características fundamentais.

O Dirty realism nos Estados Unidos reuniu autores como Raimond Carver e Charles Bukowsky, teve mesmo ancestrais próximos como Ernest Hemingway e Henry Miller, sobretudo a prosa despojada, sem receio da crítica da moral, do autor do “Trópico de Câncer”.

A técnica usada, resume-se a utilizar uma escrita na qual se iluminam sobretudo coisas que não se dizem em público. Sobrepõe-se também às regras prescritivas na gramática. Com a economia de palavras. Minimalista. Usa a mecânica de sublinhar a vida, que pode ser o fato branco onde cai uma nódoa. Que quase sempre é assim.

Realismo sujo é a ficção na qual se escreve o que ocorre na voracidade da vida contemporânea - um marido abandonado, uma mãe solteira, um ladrão de carros, um carteirista, um viciado em drogas - mas escreve-se sobre tudo isso com distanciamento perturbador, às vezes beirando a comédia- dizia, na introdução histórica do movimento, a revista Granta.

Alguns dos autores do movimento, esconderam-se atrás das suas personagens. Paradigmaticamente, o poeta Charles Bukowski. Em alemão, a isto chamava-se Maskenfreiheit, a liberdade conferida pelas máscaras. Ezra Pound, muito antes, chamou-lhes Personae.

Dois excertos do poema “Noite Imbecil” e “Pássaro Azul”, de Bukowski,

noite imbecil,

(...)

o dia foi um contínuo inferno

e agora vens

arrastando-te pelos canos

esvaziando a bexiga

por onde vais,

bebi 9 garrafas de cerveja

uma caneca de vodka

fumei 18 cigarros

e ainda te sentas em cima de mim

---------

Há um pássaro azul no meu coração que

quer sair

mas deito-lhe whisky em cima e levo

-lhe o fumo dos cigarros,

e as prostitutas e os criados

(...)nunca ficam a saber

que ele está lá dentro

(Tradução dos poema da versão castelhana por JTP)


Aqui estão presentes, em detalhe, descrições numa linha semântica de objectos do quotidiano nos seus aspectos “mais sórdidos ou mundanos da vida comum” - como define o dicionário.

João Tomaz Parreira

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