quinta-feira, 26 de abril de 2012

ISRAEL


Isarael não te esqueças de pedir a memória
nas tuas lamentações sagradas
Israel não adormeças no museu
das tuas pedras, Israel
não esqueças o mundo
Israel quando é que enviarás
todas as semanas corações
para lerem o Apocalipse?

Israel tu conheces a Lei
dos artigos de Maimónides, tens o costume
de ler Moisés e ficar preocupado
com todos os cordeiros do país
Israel tu repousas em citações
e costumas nutrir por Jeremias
a ternura das tuas lágrimas
Israel tu detestas Isaías
por isso o encerras no vidro da universidade
Isral pensa naqueles que voaram
como pombas e andaram apalpando
pela noite as suas janelas
que esconderam a vergonha dos seus olhos
em pequenas ruas, ao comprarem leite
e sal para as suas feridas
Israel quando te tornarás num menino
num bando de pombas a olhar o vento
que descansa nas figueiras
Israel levanta em redor os teus olhos
para o mundo ver que estão cheios de lágrimas
como no ano 132, quando te tornaste sionista
e vestiste Bar-Kokba de messias
Israel acorda todos os sonhos dos lábios
Israel as sinagogas são tarde demais.

1986

© J.T.Parreira

segunda-feira, 23 de abril de 2012

NO CAMINHO

caminhámos sobre as águas
e nelas semeámos a noite
para o amor feito
para nós

confiámos a distância
ao rio depusemo-nos de tudo
na luta contra as margens
até as mãos se reconhecerem no silêncio

unimo-nos
no segredo das árvores
lá, onde os navios
rasgam o caminho

Rui Miguel Duarte
23/04/12

domingo, 22 de abril de 2012

Quando eu era menino lia o Salmo oitavo - Novo livro de J.T.Parreira para download


A poesia de J.T.Parreira é poesia maior. É poesia que, ao ser lida, inevitavelmente produz a libertadora (e infelizmente rara) sensação de uma lufada de ar que nos eleva e, de roldão, transmigra-nos de nosso dia-a-dia corrido e muitas vezes repleto de sensaboria, para a dimensão poiética, de enlevo, fascinação e gozo auferidos pelas palavras  ao serem laboriosamente re-alinhadas para que ofereçam o seu melhor.

Nesses 29 poemas, escritos entre fins de 2011 e início de 2012, o vate português dá provas de seu dom de ampliar, ou melhor dito, alar as palavras, trabalhando os temas bíblicos, reafirmando poeticamente sua transcendência divina, ao re-capturar e re-vestir o que eu chamaria de seu élan  (ímpeto, vigor) devocional, como no poema que inspira o título do livro (O Salmo VIII), ou neste Pró Salmo 121:

Elevo os meus olhos para os montes
e há um monte deles
mesmo em frente,  quando caminho
no cimo dos montes as Tuas mãos
fazem o resguardo do abismo
a minha fadiga é soletrada nas palavras
com que peço socorro, o meu olhar
por isso se alonga, outras vezes
vou mais depressa
pareço um adolescente a distender as pernas
e corro sem temer o sol
nem os mistérios da lua.
Sou tão pouco perante os montes
mas eles ficam para trás e não são
mais do que poeira amontoada.

Como editor, me regozijo em oferecer aos leitores mais este volume, pequenina cornucópia de pérolas - a serem degustadas com os olhos da alma. E singela amostragem do melhor da poesia evangélica produzida atualmente em nossa língua.

Sammis Reachers

Para baixar o livro, clique AQUI.
Para ler online, clique AQUI.

sábado, 21 de abril de 2012

INSTANTE

o poeta relê 
as notas necessárias
o esboço improvável 
para o poema

equilibra nos traços
das letras
o dia e a noite
o luto e o parto
o coração e a pele

quando fala
conta num instante
a eternidade

Rui Miguel Duarte
21/04/12

quarta-feira, 18 de abril de 2012

"SÔBOLOS RIOS QUE VÃO" DE LUÍS DE CAMÕES

Um dos mais excelentes poemas jamais escritos em língua portuguesa, com o Salmo 137, a filosofia platónica, a Cruz, desgostos de amor e um fatalismo camoniano em fundo:


1
Sôbolos rios que vão
por Babilónia, me achei,
Onde sentado chorei
as lembranças de Sião
e quanto nela passei.
Ali, o rio corrente
de meus olhos foi manado,
e, tudo bem comparado,
Babilónia ao mal presente,
Sião ao tempo passado.
2
Ali, lembranças contentes
n'alma se representaram,
e minhas cousas ausentes
se fizeram tão presentes
como se nunca passaram.
Ali, depois de acordado,
co rosto banhado em água,
deste sonho imaginado,
vi que todo o bem passado
não é gosto, mas é mágoa.
3
E vi que todos os danos
se causavam das mudanças
e as mudanças dos anos;
onde vi quantos enganos
faz o tempo às esperanças.
Ali vi o maior bem
quão pouco espaço que dura,
o mal quão depressa vem,
e quão triste estado tem
quem se fia da ventura.
4
Vi aquilo que mais val,
que então se entende milhor
quanto mais perdido for;
vi o bem suceder o mal,
e o mal, muito pior,
E vi com muito trabalho
comprar arrependimento;
vi nenhum contentamento,
e vejo-me a mim, que espalho
tristes palavras ao vento.
5
Bem são rios estas águas,
com que banho este papel;
bem parece ser cruel
variedade de mágoas
e confusão de Babel.
Como homem que, por exemplo
dos transes em que se achou,
despois que a guerra deixou,
pelas paredes do templo
suas armas pendurou:
6
Assi, despois que assentei
que tudo o tempo gastava,
da tristeza que tomei
nos salgueiros pendurei
os órgãos com que cantava.
Aquele instrumento ledo
deixei da vida passada,
dizendo: -- Música amada,
deixo-vos neste arvoredo
à memória consagrada.
7
Frauta minha que, tangendo,
os montes fazíeis vir
para onde estáveis, correndo,
e as águas, que iam decendo,
tornavam logo a subir:
jamais vos não ouvirão
os tigres que se amansavam,
e as ovelhas, que pastavam,
das ervas se fartarão
que por vos ouvir deixavam.
8
Já não fareis docemente
em rosas tornar abrolhos
na ribeira florecente;
nem poreis freio à corrente,
e mais, se for dos meus olhos.
Não movereis a espessura,
nem podereis já trazer
atrás vós a fonte pura,
pois não pudeste mover
desconcertos da ventura.
9
Ficareis oferecida
à Fama, que sempre vela,
frauta de mim tão querida;
porque, mudando-se a vida,
se mudam os gostos dela.
Acha a tenra mocidade
prazeres acomodados,
e logo a maior idade
já sente por pouquidade
aqueles gostos passados.
10
Um gosto que hoje se alcança,
amanhã já o não vejo;
assi nos traz a mudança
de esperança em esperança,
e de desejo em desejo.
Mas em vida tão escassa
que esperança será forte?
Fraqueza da humana sorte,
que, quanto da vida passa,
está receitando a morte?
11
Mas deixar nesta espessura
o canto da mocidade,
não cuide a gente futura
que será obra da idade
o que é força da ventura.
Que idade, tempo, o espanto
de ver quão ligeiro passe,
nunca em mim puderam tanto
que, posto que deixe o canto,
a causa dele deixasse.
12
Mas, em tristezas e nojos,
em gosto e contentamento,
por sol, por neve, por vento,
tendré presente á los ojos
por quien muero tan contento.
Órgãos e frauta deixava,
despojo meu tão querido,
no salgueiro que ali estava
que para troféu ficava
de quem me tinha vencido.
13
Mas lembranças da afeição
que ali cativo me tinha,
me perguntaram então:
que era da música minha
que eu cantava em Sião?
Que foi daquele cantar
das gentes tão celebrado?
Porque o deixava de usar?
Pois sempre ajuda a passar
qualquer trabalho passado.
14
Canta o caminhante ledo
no caminho trabalhoso,
por entre o espesso arvoredo;
e, de noite, o temeroso,
cantando, refreia o medo.
Canta o preso docemente
os duros grilhões tocando;
canta o sagador contente;
e o trabalhor, cantando,
o trabalho menos sente.
15
Eu, que estas cousas senti
n'alma, de mágoas tão cheia,
- Como dirá, respondi,
quem alheio está de si
doce canto em terra alheia?
Como poderá cantar
quem em choro banha o peito?
Porque, se quem trabalhar
canta por menos cansar,
eu, só, descansos enjeito.
16
Que não parece razão
nem seria cousa idónea,
por abrandar a paixão,
que cantasse em Babilónia
as cantigas de Sião.
Que, quando a muita graveza
de saudade quebrante
esta vital fortaleza,
antes moura de tristeza
que, por abrandá-la, cante.
17
Que se o fino pensamento
só na tristeza consiste,
não tenho medo ao tormento:
que morrer de puro triste,
que maior contentamento?
Nem na frauta cantarei
o que passo, e passei já,
nem menos o escreverei,
porque a pena cansará,
e eu não descansarei.
18
Que, se a vida tão pequena
se acrescenta em terra estranha,
e se amor assi o ordena,
razão é que canse a pena
de escrever pena tamanha.
Porém se, para assentar
o que sente o coração,
a pena já me cansar,
não canse para voar
a memória em Sião.
19
Terra bem-aventurada,
se, por algum movimento,
d'alma me fores mudada,
minha pena seja dada
a perpétuo esquecimento.
A pena deste desterro,
que eu mais desejo esculpida
em pedra, ou em duro ferro,
essa nunca seja ouvida,
em castigo de meu erro.
20
E se eu cantar quiser,
em Babilónia sujeito,
Hierusalém, sem te ver,
a voz, quando a mover,
se me congele no peito.
A minha língua se apegue
às fauces, pois te perdi,
se, enquanto viver assi,
houver tempo em que te negue
ou que me esqueça de ti.
21
Mas ó tu, terra de Glória,
se eu nunca vi tua essência,
como me lembras na ausência?
Não me lembras na memória,
senão na reminiscência.
Que a alma é tábua rasa,
que, com a escrita doutrina
celeste, tanto imagina,
que voa da própria casa
e sobe à pátria divina.
22
Não é, logo, a saudade
das terras onde nasceu
a carne, mas é do Céu,
daquela santa Cidade,
donde esta alma descendeu.
E aquela humana figura,
que cá me pode alterar,
não é quem se há-de buscar:
é raio da Fermosura,
que só se deve de amar.
23
Que os olhos e a luz que ateia
o fogo que cá sujeita,
não do sol, mas da candeia,
é sombra daquela Ideia
que em Deus está mais perfeita.
E os que cá me cativaram
são poderosos afeitos
que os corações têm sujeitos;
sofistas que me ensinaram
maus caminhos por direitos.
24
Destes o mando tirano
me obriga, com desatino,
a cantar ao som do dano
cantares de amor profano
por versos de amor divino.
Mas eu, lustrado co santo
Raio, na terra de dor,
de confusão e de espanto,
como hei-de cantar o canto
que só se deve ao Senhor?
25
Tanto pode o benefício
da Graça, que dá saúde,
que ordena que a vida mude;
e o que tomei por vício
me faz grau para a virtude;
e faz que este natural
amor, que tanto se preza,
suba da sombra ao Real,
da particular beleza
para a Beleza geral.
26
Fique logo pendurada
a frauta com que tangi,
ó Hierusalém sagrada,
e tome a lira dourada,
para só cantar de ti.
Não cativo e ferrolhado
na Babilónia infernal,
mas dos vícios desatado,
e cá desta a ti levado,
Pátria minha natural.
27
E se eu mais der a cerviz
a mundanos acidentes,
duros, tiranos e urgentes,
risque-se quanto já fiz
do grão livro dos viventes.
E tomando já na mão
a lira santa e capaz
doutra mais alta invenção,
cale-se esta confusão,
cante-se a visão da paz.
28
Ouça-me o pastor e o Rei,
retumbe este acento santo,
mova-se no mundo espanto,
que do que já mal cantei
a palinódia já canto.
A vós só me quero ir,
Senhor e grão Capitão
da alta torre de Sião,
à qual não posso subir,
se me vós não dais a mão.
29
No grão dia singular
que na lira o douto som
Hierusalém celebrar,
lembrai-vos de castigar
os ruins filhos de Edom.
Aqueles que tintos vão
no pobre sangue inocente,
soberbos co poder vão,
arrasai-os igualmente,
conheçam que humanos são.
30
E aquele poder tão duro
dos afeitos com que venho,
que encendem alma e engenho,
que já me entraram o muro
do livre alvídrio que tenho;
estes, que tão furiosos
gritando vêm a escalar-me,
maus espíritos danosos,
que querem, como forçosos,
do alicerce derrubar-me;
31
Derrubai-os, fiquem sós,
de forças fracos, imbeles,
porque não podemos nós
nem com eles ir a Vós
nem sem Vós tirar-nos deles.
Não basta minha fraqueza
para me dar defensão,
se vós, santo Capitão,
nesta minha fortaleza
não puserdes guarnição.
32
E tu, ó carne que encantas,
filha de Babel tão feia,
toda de misérias cheia,
que mil vezes te levantas,
contra quem te senhoreia:
beato só pode ser
quem, co a ajuda celeste,
contra ti prevalecer,
e te vier a fazer
o mal que lhe tu fizeste.
33
Quem, com disciplina crua,
se fere que ua vez,
cuja alma, de vícios nua,
faz nódoas na carne sua,
que já a carne n'alma fez.
E beato quem tomar
seus pensamentos recentes
e em nacendo os afogar,
por não virem a parar
em vícios graves e urgentes.
34
Quem com eles logo der
na pedra do furor santo,
e, batendo, os desfizer
na Pedra, que veio a ser
enfim cabeça do Canto;
quem logo, quando imagina
nos vícios da carne má,
os pensamentos declina
àquela Carne divina
que na Cruz esteve já;
35
Quem do vil contentamento
cá deste mundo visível,
quanto ao homem for possível,
passar logo o entendimento
para o mundo inteligível:
ali achará alegria
em tudo perfeita e cheia
de tão suave harmonia,
que, nem por pouca, recreia,
nem, por sobeja, enfastia.
36
Ali verá tão profundo
mistério na suma Alteza,
que, vencida a natureza,
os mores faustos do mundo
julgue por maior baixeza.
Ó tu, divino aposento,
minha pátria singular!
Se só com te imaginar
tanto sobe o entendimento,
que fará se em ti se achar?
37
Ditoso quem se partir
para ti, terra excelente,
tão justo e tão penitente
que, depois de a ti subir
lá descanse eternamente.

terça-feira, 17 de abril de 2012

A Multidão




As mãos não tocam no quadro
lançam sinais, roubam
com os olhos a Gioconda
estão a cercá-la de espantos
com os olhos prontos
a levar o sorriso até à fronteira
do mistério
A Gioconda pode repousar
despir-se
do olhar e do sorriso
à noite ficar nua, ninguém
desvenda o segredo atrás do vidro.

17/4/2012

© J.T.Parreira

segunda-feira, 16 de abril de 2012

O Salmo VIII


Quando eu era menino e lia o Salmo
oitavo, ficava cheiinho de vontade
de entrar dentro dele, o mundo
criado estava todo ali, até os anjos
eram pouco maiores que os homens
as aves passavam e era nelas

que media o céu, e as estrelas?
essas cabiam nos olhos
os peixes respiravam a água dos mares
tudo era admirável e bastava uma ovelha
para o meu riso correr de um lado
para o outro dos meus pequenos lábios.

15/4/2012

© J.T.Parreira

domingo, 15 de abril de 2012

MUDA

como um cordeiro que é levado ao matadouro ou como uma ovelha emudecida nas mãos do tosquiador" 
Isaías 53:7 

vi pelos olhos de Isaías

a ovelha levada
diante dos nossos olhos
em marcha lenta
sobre o gume da faca

os escombros do mundo
dissolviam as maçãs do rosto
a mão do carniceiro
não é menos áspera
mas quiçá será mais compassiva
e lhe aliviará todo esse peso
que lhe cerra a garganta

se o gume finda na ponta
vale mais apressar o golpe
para que de uma vez por todas
se solte e ecoe o grito emudecido
se solte a dor a derradeira
como feto retido no útero
o grito que pesa sobre a espinha

é urgente a declaração
de que a marcha do silêncio
terminou

lá, no lugar onde o céu
se rasga da terra
lá, onde vi a carne
posta perante Deus e os homens
a carne que cala a boca
do mundo

Rui Miguel Duarte
15/04/12

OVELHA

como um cordeiro que é levado ao matadouro ou como uma ovelha emudecida nas mãos do tosquiador
Isaías 53:7

vi pelos olhos de Isaías
a ovelha levada
diante dos nossos olhos
em marcha lenta
sobre o gume da faca

os escombros do mundo
liquefaziam-lhe as maçãs do rosto
a mão do carniceiro
não é menos áspera
mas quiçá será mais compassiva
e lhe aliviará todo esse peso
que lhe cerra a garganta

se o gume finda na ponta
mais vale apressar o golpe
para que de uma vez por todas
se solte e ecoe o grito emudecido
se solte a dor a derradeira
como feto retido no útero
o grito que pesa sobre a espinha
do universo

é urgente a declaração
de que a marcha do silêncio
terminou

lá, no lugar onde o céu
se rasga da terra
lá, onde vi a carne
posta perante Deus e os homens

Rui Miguel Duarte
15/04/12

SONETO EM CATORZE LÍNGUAS, de Pétion de Vilar



SONETO EM CATORZE LÍNGUAS* 

Adon! Scalon lecha im ischar al,
Infaticabilmente agili e presto,
Steere ilc ken spreack ander geen tal
Bear guh, Parola, harm egeh desto!

Nin hur, mnabotin dagousch davosth,
Rimas que estalan como castanuelas;
Och bcelca akmane ekk Brasil dost
By ek fur jorth stath undir elc stéelas!

"Lulu" endeh geg med, inged tung kreisen,
Iquê talaçu lenca suayá...
Lass mich, "Parola", hoch dich preisen!

Não são coisas banais esses decênios;
Allons! Fais comme Horace; crie; "Hourrah"!
Monumentum exegi aere perenius!

Pétion de Vilar

TRADUÇÃO: "Mestre! Nos domínios espinhosos do verso,
infatigavelmente ágil e presto, tudo fizeste sentir; e até parece que
não sabes outra linguagem, senão a do verso, "Parola", tu que brincas
com as rimas, como se fossem borboletas!

Somente tu, no violão das coisas alegres, sabes imaginar rimas que
estalam como castanholas, provocando a gargalhada do Brasil inteiro,
como outrora os alegres bandos da Hélade!

Sinto, "Lulu", sério embaraço para terminar este soneto. É aqui que a
porca torce o rabo... Deixa-me, "Parola", que te exalte olimpicamente.

Não são coisas banais esses decênios. Vamos, faze como Horácio, grita:
"Hurra! ergui um monumento mais durável que o bronze!"

*Célebre soneto composto em catorze idiomas (respectivamente, hebraico, italiano, flamengo, escudra, árabe, espanhol, islandês, gótico, dinamarquês, tupi, alemão, português, francês e 
latim), pacientemente organizado por Pétion de Vilar, pseudônimo que levará à posteridade o nome do notável médico baiano Doutor Egas Muniz Barreto de Aragão (1870-1924). O soneto 
transcrito foi composto a título de saudação aniversária a "Lulu Parola", criptônimo literário do poeta humorista Aloísio de Carvalho.

Fonte: Sonetário Brasileiro - http://www.elsonfroes.com.br/

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Casamento Adiado



Os pretendentes de Ítaca só tinham olhos
para Penélope de dia
de noite
o coração de Penélope era pedra
e eles não sabiam
era a saudade que demorava no tear

na ponta dos dedos desfazendo o manto
que fazia ao sol.


12/4/2012


© J.T.Parreira

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Gabriela Mistral - Decálogo do artista




Decálogo do artista 

I- Amarás a beleza que é a sombra de Deus sobre 
o universo.

II- Não há arte atéia. Ainda que não ames o Criador
o afirmarás criando à sua semelhança.

III- Não darás a beleza como sedativo para os sentidos, 
sim como o natural alimento da alma. 

IV- Não te será pretexto para luxúria nem para 
a vaidade, sim exercício divino. 

V- Não a buscarás em férias nem levarás 
tua a elas, porque a Beleza é virgem, 
e o que está em férias não é ela.

VI- Subirás de teu coração a teu canto e te haverás 
purificado a ti em primeiro.

VII- Tua beleza se chamará também misericórdia, 
e consolará o coração dos homens. 

VIII- Darás tua obra como se dá um filho: restando 
sangue em teu coração. 

IX- Não te será a beleza ópio amortecedor, 
sim vinho generoso que te incendeia para a ação, 
pois, se deixas de ser homem ou mulher, 
deixarás de ser artista.

X- De toda a criação sairás com vergonha, 
porque foi inferior a teu sonho, e inferior
a esse sonho maravilhoso de Deus 
que é a Natureza.


via http://serpoeta.blogspot.com.br

terça-feira, 10 de abril de 2012

As palavras que me assustam


Ironia ou não as palavras assustam-me
Por isso vacilo no momento de as largar 
Porque me pertencem
Receio as leituras erradas que possam delas,
e com elas fazer
Mas os gestos, os olhares,
as expressões faciais,
os sorrisos,
largo-os instantânea
e destemidamente
Só as palavras é que não!

10/4/2012

© Florbela Ribeiro *


* Poeta nascida em Aveiro, 1971, trabalha predominantemente na área do conto evangélico; na poesia tem uma voz própria, fala poesia como escreve, os seus poemas vêm da raíz da sua fala.  É uma poesia expressiva.

O primeiro poema expressionista

Famoso poema, publicado em revista em 1911. De Jacob Van Hoddis . É considerado o primeiro expressionista.
Optamos por uma tradução a partir do inglês (com incontornável recurso ao dicionário de alemão), mas sem usar a rima, procurando pelo menos manter a dicção do verso com motivos expressionistas, adequada à visão irónica e grotesca desse movimento artístico da primeira década do Século XX.

 O Fim do Mundo (Weltende)


Um chapéu voa destapando um burguês.
Todo o ar ressoa como um grito.
Aterram os telhados e quebram-se em dois.
A costa- lê-se nos jornais-está cheia das marés.

A tempestade aí está, o tropel dos oceanos
desembarca e esmaga os grossos diques.
A constipação de muita gente vê-se no nariz,
e os comboios caem nos túneis.

(Trad. de J.T.Parreira)

segunda-feira, 9 de abril de 2012

TAL QUAL UM GATO



 Um gato é um poema.
Jean Burden
 



É um peixe de prata flexível
quando passa sem silêncio
vento apenas
roçando as nossas pernas, é macio
como alguém em quem pensamos
é uma sombra
no movimento das duas consoantes
seja qual for a sua cor
por vezes como um poema
o olhar do gato toca
campainhas no nosso coração.

17/2/2012

J.T.Parreira

HOJE, PÁSCOA


“Iam a correr…”
Evangelho segundo João 20:4

hoje preferimos
deixar o sono dormindo na cama
e correr, correr ao túmulo
porque nos disseram que a morte
havia de si própria fugido

deixámos tudo até o peixe
fazer a sua faina nas brasas
e a fome arder só ao lume
e correr, correr ao túmulo
porque nos disseram que a pedra
havia desertado

hoje preferimos
saltar obstáculos
e mesmo pisar urtigas com ambos os pés nus
porque nos disseram que a vida
conquistara o vento

preferimos ao linho
molhado em aloés
antes molhar as frontes
com a água corrente da vertiginosa pressa
de chegar ao túmulo
o lugar de descansar
do tumulto o coração

9/04/12

sábado, 7 de abril de 2012

O QUE SE MOSTRA

“Depois mostrou-lhes as mãos…”
Evangelho segundo João 20:20

mostro-te as minhas mãos
as mãos que reconheces
pelo toque vazio dos pregos

estas mãos que aspergiram
os rios imortais entre os montes
mãos que dispersaram
no firmamento as poeiras
do tempo
inaugurando o ciclo das estações
debaixo da pulsação do sol
que criaram as notas musicais
para tu cantares
mãos que esculpiram os rostos
dos homens em madeira rara

mãos cujos dedos são finos
como os das aves
e cujas palmas a morte
pouco a pouco amarrotou
até à extinção total

mostro-te estas mãos
que beijaram os espinhos
e deles extraíram latejante
a rosa

Rui Miguel Duarte

7/04/12

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Haicai ( XXIV)


Duas botas descansam                            

Van Gogh agora                                     

Pinta corvos sobre as nuvens

6/4/2012

J.T.Parreira

terça-feira, 3 de abril de 2012

Um poema de Jacques Prévert: Familiar




FAMILIAR
               
Tradução: Silviano Santiago

A mãe faz tricô
O filho vai à guerra
Tudo muito natural acha a mãe
E o pai que faz o pai?
Negocia
A mulher faz tricô
O filho luta na guerra
Ele negocia
Tudo muito natural acha o pai
E o filho e o filho
o quê que o filho acha?
Nada absolutamente nada acha o filho
O filho sua mãe faz tricô seu pai negocia ele
                                      [ luta na guerra
Quando tiver terminado a guerra
Negociará com o pai
A guerra continua a mãe continua ela tricota
O pai continua ele negocia
O filho foi morto ele não continua mais
O pai e a mãe vão ao cemitério
Tudo muito natural acham o pai e a mãe
A vida continua a vida com o tricô a guerra
                                      [ os negócios
Os negócios a guerra o tricô a guerra
Os negócios os negócios e os negócios
A vida com o cemitério.



via http://www.algumapoesia.com.br

segunda-feira, 2 de abril de 2012

VINTAGE



O corpo é um espanto na brancura
nu
o olhar se eleva à divindade da matéria
Nos anos vinte a nudez

era a da carne por baixo dos vestidos
e um subtil ardor nos olhos e na boca
um pasmo a espremer um Oh!
Escondido dos olhares
tudo se passava além do vidro.

1/4/2012


J.T.Parreira

("Vintage", fotografia de Robert Doisneau)
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