quarta-feira, 23 de julho de 2025

Ser homem é considerar a maciez de toda carne humana, mas isso não se confessa - Sammis Reachers

 


Foi numa sexta-feira carregada.

Do outro lado da porta giratória girei e estaquei,

Fuças langues no vidro temperado, dando uma boa manjada

No guarda daquele banco que me negou o consignado.

Bati um pouco de boca lá com o gerente, tudo bem,

Cliente há doze anos!, O guarda me pegou

E conduziu para fora, embalado nos trapos da truculência.

Balouçando sob uma mangueira imaginária (praça de meus dias ruins),

De sólido abismo abaixo, olhei aquele meu próximo

Com os olhos de Caim, e pequei. Pequei

Ao aventar uma minha antiga imaginação ou tirocínio,

Fetiche com que diminuo os homens até o ponto de equilíbrio.

 

Aquele guarda sangra. Quase tão bem quanto o gerente, ou dá empate. São homens, afinal. E no início também. Não que eu vá fazer nada, que quando o medo não me impede a fé me manieta. E minha mãe me pariu pra civil, e educou com esmero de matuta mineira.

Mas eles têm toda a cara, aquela cara bolachuda, de que sangram.

 

Os oito marginais que tomaram teu bairro

(Tudo bem, sempre foi deles, estavam por aí,

Potências negativas na bolsa escrotal de seus pais, moradores de bem)

Trastes que vão do miliciano ao traficante

Passando pelo sociólogo e o ladrão de bicicletas

Todos sangram.

 

Donald Trump, os ninjas, o carteiro e o Papa Francisco, coitado, prestes a morrer

Sangram sangram sangram e sangram, dançarinos vermelhos,

Carnes doces feito a minha e a tua, essas esponjas-de-furar.

 

O grande professor de jiu-jitsu de teu filho (o herói dele não é você?)

O policial marrudo teu vizinho de carros alemães na garagem armas austríacas no armário

As gordas faladoras ou anoxéricas botoxicômanas que armam

Barraco no ônibus Caxias-Central ou no voo da Emirates

Elas e os demais eleitores que confiam na sorte, no gênero, na dura e etérea (mas exangue) lei

Sangram, santas, safadas, safades

Rubras como o cara mais valente na pancadaria

Que já vi, num baile funk em 1997 onde entrei de penetra,

Passarinho aloprado por morcegos:

Ele abriu uma clareira no meio de oito, e lhes ensinou

Lá uma boa lição. Oito. Mas ele sangrava, e ele sangrou.

 

Saio pelas ruas contentado-emporcalhado nesta sombria certeza, olhando dissimulado nos olhos do ditador, do ministro, do ladrão, do fiscal de posturas e até, quando ele não está olhando de volta, do miliciano e suposto assassino serial que é segurança lá na padaria do Jofre, e que passa os dias sentado, bebericando café e encarando os homens com um baita de um olhar mortiço:

Todos sangram, e sem cura. Todos têm uma carne macia

Da tessitura exata da minha.

Sei que sou uma besta palraz, mas esse tipo de pensamento

Tem dias meio que me desembesta, me alavanca.

Também me causa aos domingos engulhos, vergonha desse meu pecado grosseiro,

Ou um enjoo adocicado, déjà vu do que nunca vi

(Podridão que meus genes regurgitam?),

Quando adentro o açougue do Mauro

Eu precisava contar isso no papel, e me livrar de alguns quilos de sua cangalha, jogá-la um pouco em outras costas feito a tua, meu virtuoso leitor. Compartilhar miséria é terapia, e eu só tenho dinheiro pra papel. E no fundo no fundo, abaixo do tapete das ações e reações e das cláusulas do contrato social, todos sabemos de nossa blandícia.

 

Viva em paz, mas saiba que toda guerra

É feita por gente macia.

Gente macia

É a única gente que existe.

*   *   *   *

Do livro Primeiressências (2025). 

Disponível para download gratuito, AQUI.


terça-feira, 1 de julho de 2025

Revista Cristã de Literatura e Artes para download grátis - AMPLITUDE n.º 6

 

Meados de 2025: AMPLITUDE chega a seu sexto número, pela graça de Deus. Sim, apenas o sexto número, mas esta revista está fazendo sólidos dez anos. Foi no ano (pacífico, olhando de agora) de 2015 que nosso primeiro número chegava às tribunas virtuais.

Neste número, como se diz no hodierno jargão futebolístico, "a base vem forte": ficção e poesia, bases, lajes e pilares desta revista, entram em campo com uma seleção especialmente de peso, potente de autores do norte ao sul, do nadir ao zênite do Brasil. E até de Portugal e Moçambique.

As seções que o leitor tem aprendido a amar estão aqui, com acréscimos e ausências, que fazem parte do jogo.

Não apenas divulgar, mas estimular a produção artística é um de nossos motivos. Na página 12, temos o artigo O Credo de Um Artista, onde Jason Harms, apesar de seu empenho assaz puritano (calma, você não precisa concordar com tudo), oferece bons tópicos de reflexão e adesão para colocarmos Deus no centro de nossa produção criativa. No embalo, o artigo 12 Passos para ser criativo (pág. 27) dá excelentes — e simples — dicas que entregam o que prometem.

Em Jardim dos Clássicos, um conto de um clássico até que bem recente, o escritor e imortal da ABL Orígenes Lessa.

Temos crônica daquele que muitos consideram nosso maior poeta evangélico, Gióia Júnior, falando sobre aquele que ele, Gióia, considera o maior poeta brasileiro.

A revista abre com um papo sobre o trabalho editorial que realizamos no ministério Veredas Missionárias. Em nosso entendimento, não há como ser cristão (seja indivíduo, família, igreja, denominação, nação) sem ser missionário. Estamos aqui a trabalho, um trabalho penoso e simples, levar o Evangelho até o último povo, língua e nação. O mais que escapa ou bordeja esta prerrogativa é passeio ou tergiversação, ou, quando muito, ensaio. Assim, seguindo e ampliando uma iniciativa que começou em nossa última edição, veiculamos aqui gratuitamente (e mesmo à revelia) anúncios sobre empresas, pessoas e serviços que contribuem de forma direta com a causa missionária. Se este é o seu caso, entre em contato e nos traga sua história, que no próximo número você poderá aqui figurar.

Em tempo, pois há tempo: O leitor perspicaz perceberá opiniões (políticas, teológicas, cosmovisionais) díspares ao longo dos textos de AMPLITUDE. Veículo plural, as opiniões dos autores não refletem necessariamente a opinião da revista (sei que é ridículo ter que dizer isso, mas até a The New Yorker, Granta e a The Paris Review o fazem. Pobres de nós).

Editarmos sozinhos uma revista como esta, com tantos textos, tantas seções, tantas especializações, é estafante. Mas o resultado gratifica: A literatura, e mais, o conhecimento, dom de Deus, celebra sua pequena e cordata festa, da qual você, leitor, é um convidado de honra. O Cordeiro é digno!

Por favor, não apenas leia, mas compartilhe esta revista gratuita, que existe para entreter, edificar e desmistificar vidas.

 

      Sammis Reachers, editor


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