O poeta paulistano Pedro
Marcos Pereira Lima é graduado em Letras, e autor dos livros Casas com Asas,
No Tempo da Poesia e Palavras Crianças no Jardim de Aula.
Em sua nova obra, Pisando
na Grama, o autor reúne novos e antigos poemas de sua lavra pulsante.
Marcos é carne e alma preta
na cidade, irmanando-se nas dores, palavra comprometida com a dor e a vida.
Fiel a seu ofício, o autor
arranca versos da insipidez da pedra, do cinzento da cidade e suas nuances, do
corriqueiro que navega o dia a dia. Melhor, versos empresta, atento ao que vai sob
a superfície.
E, metaliteralizando ela,
a sexta arte, obtém palavra pura, poesia em ares, libertação das cadeias.
Publicado pela Desconcertos Editora, o livro pode ser adquirido AQUI.
Com vocês, alguns versos
de Pedro Marcos Pereira Lima.
NEGRURA
Ao Edson Cruz,
pelo livro Negrura
negrura é
agrura né?
palavra aguda
na grade gruda
por um fio
de fio em fio
a tessitura
da escritura
vai sendo escrita
na voz que grita
livro encarnado
de negro retrato
na cor das cores
a face das dores
o corte da cor
na coroa da corte
saltando da fala
da negra senzala
voz expandida
além da língua
esboça a pintura
com toda tintura
da dura negrura
PERGUNTA
por que a cor do humano
é desacordo
para a convivência?
ARQUEOLOGIA
do fundo de um poço
desenterro um osso
esquecido há milênios —
puxando o soneto:
encontro um esqueleto
roído de devaneios
o pescoço envolto
num colar, por amuleto
da pirâmide geométrica
dos grandes grãos de pedra
o sol espraia sombras
de retintos faraós
que desde sempre tombam
extintos da memória
*
esses
que levaram
nas costas
as pedras
degraus acima —
eram deuses?...
astronautas?...
escravos
eram esses
LAR
nesse tempo cotidiano
da cidade habitada
de abandono
o acolhimento
encontre um espaço
nesse cimento
na criança ou velho
de toda idade
pelos becos da cidade
onde pouse
um lugar de luz
resplandeça
acordem os sonâmbulos
a fé ouse
o amor apareça
DIÁLOGO MONÓLOGO
ruídos do silêncio
falam mais do que penso —
a mudez dispenso
palavras amam-se
mas cuidado —
palavras tramam
o que é essência
pode ser excrescência
esse som enviesado
***
mas, nenhum conflito:
a barriga da alma
abriga
o corpo do espírito
SONANTE
deixo que os sons
me apurem os ouvidos –
cantos de galos
e bem-te-vis em acordes
que os sonhos
que te mordem
te acordem
aqui e ali arrumo
os enganos
nos quais tropeço
e meço os danos
alguém me dizia:
fantasia é ilusão
utopia é esperança
com razão:
a poesia
é uma
criança de rua
e dela fisgo a inspiração
e recolho
seus sonhos mendigos
e trago
para que escutem
suas vozes
em risos ruidosas
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