B@rroc@ e Rokokó, poesia de mínimos e de plenos, transbordamento do areal e mar que são as palavras. Revoltado alumbramento. Assim a poesia de Daniel Glaydson Ribeiro se apresenta, em seu livro Pulsão de Língua (Mirada, 2021). Dispostos em compartimentos, capítulos ou cápsulas de independência lírica, rítmica e temática, seus poemas se desdobram sobre o próprio chão: a linguagem, e dos saltos metalinguísticos e transliterários avançam até o chão do dia, com uma verve de engajamento e denúncia.
Aqui, para deleite dos leitores deste blog, alguns poemas e trechos do livro:
Epopeia do Cordel (trechos)
A sapiença do povo
tá no riso sem frescura,
na poesia das mata
sem sacra Literatura.
Vez por vez tem desavença,
mas no duelo tem quem
vença:
viola na noite escura!
[...]
E agora com a internet
dos links multimodais,
toda ciranda que eu cante
roda o mundo em arraiais:
digo oxente e tô na
Rússia,
traduzido lá na Prússia,
meu começo é sem finais!
Pois então lhe passo o
verso
A ocê, minha formosura
Qual inté aqui chegou
Dichavando essa bravura!
Bravo é ler os camarada,
Entender nossa jornada
Em defesa da cultura.
REZA
No instante em que a
lágrima
lava minha vista para a palavra
do Teu Canto,
tal
qual a sentinela,
"minha alma anseia
por Ti, pelo nascer do dia".
A natureza não tem moral
e sua água é(ra) límpida.
Da
terra e da pedra,
inda brota água pura.
Cala a ira dos impostores
que ousam proferir Teu Nome
com a boca e a língua
pútridas
de genocídio.
Só muito depois compreendi
que esta ventania
constante
já é Tua Voz,
num
simples sopro sempiterno.
ESQUIZOCAPITAL
Era uma vez minha terra
tinha palmeira e palmares
hoje tudo queima
e a Flor-
esta
cinza pelos ares:
cinza que cobre estrelas
fumaça enforca dores
ouro-lama afoga gente
num rio tóxico
Rio Doce
os quilombos e as aldeias
que diziam
"demarcadas"
são o intermitente cenário
de guerra das bandeiradas
minha terra, nina
nem sei mais se é terra ou
veneno
e tudo continua sendo
para o progresso
de São Paulo
COMO
...se ao poema coubesse
ainda e apenas
Lê-lo, com humana voz sem
excesso
no ritmo puro do tempo
disperso
como se houvessem raças e
antenas,
numa ausência de qualquer
artifício,
como se eu detrás duma cortina,
sumisse, e esta língua que
imagina
já não fosse a máquina do
início.
Tal corno a luz do sol ou
a da lua
as nuvens, os raios e
tempestades
são sublime
teatro-transcendência,
a Voz é meu corpo a
dançar, eu nua;
línguas é ruído de todas
as vontades,
o poema:
barulho-excesso-essência.
V
Beijar a humanidade
mesmo desvirtuada
(Virtude, vento
que passa pleno
de sementes,
ex-cesso
que vigora)
com a esperança de um
louco
se é que os loucos esperam
Haikai
o cheiro do tempo
um quintal frutificando
lentamente, dentro
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