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quinta-feira, 17 de março de 2016

EPITÁFIO


"C'était la Mort! Alors il la pria d'attendre
Qu'il eût posé le point à son dernier sonnet!"
Do "Epitaphe" de Gérard de Nerval (1808-1855)

Um dia chegou por trás da cortina
insinuou-se pediu um cálice de vinho
o último e melhor — disse — que o melhor
é sempre o do fim. Bebeu de mansinho.

Veio colhê-lo desapercebido como uma flor
ainda no pico da cor da essência mais fina.
Escrevia. Explicava às Musas onde colocar
o ponto final do último poema a entregar

ao sonho, que fosse a lágrima ainda quente
do bronze mais perene, que diga a glória ausente
do poeta. Ele deitou-se: veio colhê-lo pela fronte,
embalsamou-lhe as mãos para não mais escrever

e os olhos para não mais ver. Esbate-se um horizonte
sempre que um poema acaba e um poeta se cala.
Mas lá continuava o visitante a beber.
O poeta lhe disse: espera sentado, podes ficar a fazer sala.

Rui Miguel Duarte
11/03/2016

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