Uma experiência
capital na infância. Um judeu da
aldeia vizinha, chamado Mausche, negociante em gado e terras, vez por outra
passava por Günsbach com sua carroça puxada a burro. Não havia então um único
morador judeu em nossa cidadezinha, o que tornava cada visita de Mausche um
acontecimento para a garotada que corria atrás dele e zombava. Para provar que
já começava a sentir-me adulto, certo dia fui participar dessas brincadeiras,
embora não atinasse propriamente com o sentido delas. Assim, juntamente com os
outros, corria atrás do homem e do seu burrico, gritando: - Mausche! Mausche!
Os mais atrevidos dobravam a ponta do avental ou do paletó para formar uma
orelha de porco e pulavam até junto dele. Assim o perseguimos até fora da
aldeia. Mausche, porém, com suas sardas e a barba grisalha, caminhava tão
imperturbável quanto o burrico, voltando-se de quando em quando para trás e
sorrindo, encabulado e bondoso. Esse sorriso deixou-me subjugado. Desse Mausche
aprendi pela primeira vez o que significa manter-se calado em meio à
perseguição. Tornou-se para mim um grande educador. A partir dali, saudava-o
cheio de respeito. Mais tarde, no tempo do ginásio, adquiri o hábito de dar-lhe
a mão e andar com ele um pedaço de caminho. Mausche nunca soube o quanto
significou para mim. Diziam dele ser usurário e retalhador de terras. Nunca
tratei de averiguá-lo. Continuou sendo para mim o Mausche do sorriso que
perdoa, e até hoje sugere-me paciência quando tenho ímpetos de enfurecer-me.
in Minha Vida e Minhas Ideias