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segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Para tempos de ecocídio, Castro Alves: A QUEIMADA


A QUEIMADA

MEU NOBRE perdigueiro! vem comigo.
Vamos a sós, meu corajoso amigo,
Pelos ermos vagar!
Vamos lá dos gerais, que o vento açoita,
Dos verdes capinais n'agreste moita
A perdiz levantar!...

Mas não!... Pousa a cabeça em meus joelhos...
Aqui, meu cão!... Já de listrões vermelhos
O céu se iluminou.
Eis súbito da barra do ocidente,
Doudo, rubro, veloz, incandescente,
O incêndio que acordou!

A floresta rugindo as comas curva...
As asas foscas o gavião recurva,
Espantado a gritar.
O estampido estupendo das queimadas
Se enrola de quebradas em quebradas,
Galopando no ar.

E a chama lavra qual jiboia informe,
Que, no espaço vibrando a cauda enorme,
Ferra os dentes no chão...
Nas rubras roscas estortega as matas...,
Que espadanam o sangue das cascatas
Do roto coração!...

O incêndio — leão ruivo, ensanguentado,
A juba, a crina atira desgrenhado
Aos pampeiros dos céus!...
Travou-se o pugilato... e o cedro tomba...
Queimado..., retorcendo na hecatomba
Os braços para Deus.

A queimada! A queimada é uma fornalha!
A irara — pula; o cascavel — chocalha...
Raiva, espuma o tapir!
...E às vezes sobre o cume de um rochedo
A corça e o tigre — náufragos do medo —
Vão trêmulos se unir!

Então passa-se ali um drama augusto...
N'último ramo do pau-d'arco adusto
O jaguar se abrigou...
Mas rubro é o céu... Recresce o fogo em mares...
E após... tombam as selvas seculares...
E tudo se acabou!...

terça-feira, 24 de setembro de 2019

As Antologias como equipamento didático: Exposição, defesa e perspectivas



RESUMO

No Brasil, pouca é a literatura crítica sobre o gênero antologia e também sobre seu oficiante, o antologista. A reflexão sobre o gênero decai em ainda maior lacuna quando pensado em correlação com a educação. O presente artigo objetiva: Refletir sobre o conceito de antologia e a figura do antologista; analisar a validade das antologias enquanto equipamento de ensino; fazer a defesa desta modalidade litero-editorial; apresentar perspectivas para sua melhoria enquanto produto editorial; e incentivar a que professores possam proceder à sua confecção e utilização nos processos didáticos nos ensinos fundamental e médio, em todas as disciplinas. O método de pesquisa foi fundamentado em revisão bibliográfica e estudos de caso. Como resultados do presente estudo, pudemos dimensionar a imensa lacuna bibliográfica referente ao tema, notadamente em sua imbricação pedagógica, lacuna que buscamos minorar. Confrontamo-nos ainda com as dificuldades de ordem legal e prática para a ampliação do uso da antologia no processo pedagógico por parte dos docentes, e pudemos tecer proposições críticas e práticas para facilitar e ferramentar professores para a utilização deste gênero. A partir dos resultados obtidos, concluímos pela necessidade de ampliação da reflexão acadêmica e pública sobre o tema da antologia, a ampliação de sua utilização em todo o maquinário escolar e mudanças na legislação do direito autoral que facilitem sua elaboração pelo docente, temas que trazemos à discussão pública. 

PALAVRAS-CHAVE: Antologia; Antologista; Formação de Professores; Teoria da Literatura; Didática

BAIXE O ARQUIVO PELO GOOGLE DRIVE, CLICANDO AQUI.

Sammis Reachers

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

A poesia experimental de O Poema Sem Fim

Sammis Reachers

O Poema Sem Fim é um projeto de meta/hiper/literatura, uma espécie de poema multimodal em continuidade, que alimento, como a uma besta, desde o mês um de 2011.

Aqui, o trecho inserido hoje, 11/09/2019

É função da Poesia
Explotar o coração dos homens
Assim como a magia negra
Explota os corações dos demônios e batráquios
Poema, feromônio alfabético,
forma frágil de fulgurar,
dactilothanaticamente conduzir
Um carroção de transencantos, sílfides sintagmas

Um poema deve ser sempre uma fenovenotragedia (fenomenológico em sua venalidade trágica)
Casa de Incêndios,

Abrigo da chama incircuncisa
Cansacinchaço circular das palavras

Ferida no lombo da língua


Conheça esta forma tênue da prosódia do caos: https://opoemasemfim.blogspot.com/

domingo, 8 de setembro de 2019

Nem a Rosa, nem o Cravo... - Conto de Jorge Amado (sobre o nazismo)

As frases perdem seu sentido, as palavras perdem sua significação costumeira, como dizer das árvores e das flores, dos teus olhos e do mar, das canoas e do cais, das borboletas nas árvores, quando as crianças são assassinadas friamente pelos nazistas? Como falar da gratuita beleza dos campos e das cidades, quando as bestas soltas no mundo ainda destroem os campos e as cidades?
Já viste um loiro trigal balançando ao vento? É das coisas mais belas do mundo, mas os hitleristas e seus cães danados destruíram os trigais e os povos morrem de fome. Como falar, então, da beleza, dessa beleza simples e pura da farinha e do pão, da água da fonte, do céu azul, do teu rosto na tarde? Não posso falar dessas coisas de todos os dias, dessas alegrias de todos os instantes. Porque elas estão perigando, todas elas, os trigais e o pão, a farinha e a água, o céu, o mar e teu rosto. Contra tudo que é a beleza cotidiana do homem, o nazifascismo se levantou, monstro medieval de torpe visão, de ávido apetite assassino. Outros que falem, se quiserem, das árvores nas tardes agrestes, das rosas em coloridos variados, das flores simples e dos versos mais belos e mais tristes. Outros que falem as grandes palavras de amor para a bem-amada, outros que digam dos crepúsculos e das noites de estrelas. Não tenho palavras, não tenho frases, vejo as árvores, os pássaros e a tarde, vejo teus olhos, vejo o crepúsculo bordando a cidade. Mas sobre todos esses quadros bóiam cadáveres de crianças que os nazis mataram, ao canto dos pássaros se mesclam os gritos dos velhos torturados nos campos de concentração, nos crepúsculos se fundem madrugadas de reféns fuzilados. E, quando a paisagem lembra o campo, o que eu vejo são os trigais destruídos ao passo das bestas hitleristas, os trigais que alimentavam antes as populações livres. Sobre toda a beleza paira a sombra da escravidão. É como u’a nuvem inesperada num céu azul e límpido. Como então encontrar palavras inocentes, doces palavras cariciosas, versos suaves e tristes? Perdi o sentido destas palavras, destas frases, elas me soam como uma traição neste momento.
Mas sei todas as palavras de ódio, do ódio mais profundo e mais mortal. Eles matam crianças e essa é a sua maneira de brincar o mais inocente dos brinquedos. Eles desonram a beleza das mulheres nos leitos imundos e essa é a sua maneira mais romântica de amar. Eles torturam os homens nos campos de concentração e essa é a sua maneira mais simples de construir o mundo. Eles invadiram as pátrias, escravizaram os povos, e esse é o ideal que levam no coração de lama. Como então ficar de olhos fechados para tudo isto e falar, com as palavras de sempre, com as frases de ontem, sobre a paisagem e os pássaros, a tarde e os teus olhos? É impossível porque os monstros estão sobre o mundo soltos e vorazes, a boca escorrendo sangue, os olhos amarelos, na ambição de escravizar. Os monstros pardos, os monstros negros e os monstros verdes.
Mas eu sei todas as palavras de ódio e essas, sim, têm um significado neste momento. Houve um dia em que eu falei do amor e encontrei para ele os mais doces vocábulos, as frases mais trabalhadas. Hoje só 0 ódio pode fazer com que o amor perdure sobre o mundo. Só 0 ódio ao fascismo, mas um ódio mortal, um ódio sem perdão, um ódio que venha do coração e que nos tome todo, que se faça dono de todas as nossas palavras, que nos impeça de ver qualquer espetáculo – desde o crepúsculo aos olhos da amada – sem que junto a ele vejamos o perigo que os cerca.
Jamais as tardes seriam doces e jamais as madrugadas seriam de esperança. Jamais os livros diriam coisas belas, nunca mais seria escrito um verso de amor. Sobre toda a beleza do mundo, sobre a farinha e o pão, sobre a pura água da fonte e sobre o mar, sobre teus olhos também, se debruçaria a desonra que é o nazifascismo, se eles tivessem conseguido dominar o mundo. Não restaria nenhuma parcela de beleza, a mais mínima. Amanhã saberei de novo palavras doces e frases cariciosas. Hoje só sei palavras de ódio, palavras de morte. Não encontrarás um cravo ou uma rosa, uma flor na minha literatura. Mas encontrarás um punhal ou um fuzil, encontrarás uma arma contra os inimigos da beleza, contra aqueles que amam as trevas e a desgraça, a lama e os esgotos, contra esses restos de podridão que sonharam esmagar a poesia, o amor e a liberdade!